A ausência de alguém parece ocupar um espaço desproporcional, como se aquela pessoa tivesse levado consigo uma parte essencial de nossa própria orientação interna. A sensação é semelhante à saudade, mas carrega sutilezas que vão além do simples afeto. É como se algo tivesse sido tirado de forma abrupta, deixando uma região sensível demais para ser tocada, a famosa "puxada de band-aid". Mas, quando se observa isso com um pouco mais de calma, essa falta revela um contorno peculiar, quase desconfortável, como se não estivesse ligada exatamente à pessoa, mas ao que ela representava em uma dinâmica emocional já desgastada. Com um pouco de sinceridade, percebe-se que essa sensação de perda tem mais a ver com a ideia de valor do que com o vínculo em si. A mente insiste em tratar a partida como se algo insubstituível tivesse se rompido, criando uma narrativa emocional de grandeza que não reflete a realidade. Isso gera um conflito interno, similar ao de alguém que vê objetos inúteis sendo retirados da casa de um acumulador e, mesmo assim, sente resistência. A sensação de posse se confunde com apego emocional e, muitas vezes, esconde uma fragilidade íntima em reconhecer o que realmente importa.
A desorientação que vem desse rompimento não é exatamente um medo do mundo, mas sim a descoberta tardia de que se caminhou por muito tempo com apoios desnecessários. Quando esse apoio cai, o vazio se torna evidente. E a dor não está apenas na perda, mas no choque de perceber o quanto se andou de maneira limitada, acreditando precisar de algo que sempre foi dispensável. A consciência desse tempo perdido se transforma em uma ferida que arde mais pela vergonha do que pela saudade. É um reconhecimento silencioso de que não havia um inimigo externo. E o que havia era apenas a dificuldade de assumir o próprio eixo.
É nesse momento que a mente tenta simplificar a dor, racionalizar, alegando que se trata apenas da falta da pessoa. Porque é menos ameaçador imaginar saudade do que encarar a verdade de que a ausência revelou um buraco interno antigo. O discurso emocional tenta convencer que o que dói é a perda, quando, na verdade, o que dói é o confronto com o vazio que existe dentro de nós. A pergunta sobre onde essa falta reverbera mostra que a ausência é ampla demais para ser pessoal. Ela se espalha por toda a vida porque não pertence somente a ela, mas a quem a sente.
No fundo, não há uma real distinção entre a desorientação atual e a sensação de vazio que acompanha a vida. Ambas surgem do mesmo lugar, da mesma desconexão consigo mesmo, do mesmo medo de descobrir que a dependência emocional era uma maneira de evitar assumir o próprio protagonismo. O desejo de esquecer parece tentador, pois apagaria a vergonha do erro repetido, mas o esquecimento não traz aprendizado. Ele apenas empurra o padrão para frente, repetindo-o em outros rostos, outras histórias, outras ilusões.
A verdadeira ruptura não é com a pessoa que se foi, mas com a versão interna que acreditou precisar dela para existir. É esse desprendimento que assusta, porque exige que se assuma cada passo daqui pra frente sem um projeto externo para culpar. A dor de perder alguém diminui com o tempo, mas a dor de perceber quem se foi dentro de si mesmo exige uma coragem bem maior.
27 novembro 2025
Sobre saudade e o vazio escondido
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