Existem laços que se formam a partir de uma entrega desigual, e por muito tempo eles parecem equilibrados apenas porque um dos lados carrega o peso de dois. É assim que acontece quando a presença de alguém se transforma em abrigo, enquanto o outro acaba aprendendo a se resguardar sem nunca entender como realmente ficar. Durante um longo período, a atitude de cuidar disfarça o cansaço, e o amor passa a se confundir com obrigação. A ideia de reciprocidade acaba sendo postergada, até que o corpo reconhece o que a mente se recusa a aceitar: o sentimento só existia em uma única direção.
Aquele que sustenta tudo aprende a viver no desequilíbrio. Ele se torna um expert em decifrar silêncios, justificar ausências, e até em ver beleza nas migalhas. A esperança vira uma rotina, e o afeto se transforma em hábito, a reciprocidade se transforma em recompensa. Quando o vínculo se sustenta só por um lado, os sentimentos acabam carregando o peso da exaustão de quem luta para manter algo vivo que já não responde mais. É uma solidão que não surge da falta, mas da presença que nunca se completa.
Chega um ponto em que o corpo começa a reagir ao que o coração insiste em ignorar. O sono fica leve demais, o riso perde a espontaneidade, e o olhar se apaga. O peso da insistência se torna mais claro do que a saudade que o outro provocaria. É nesse momento que o silêncio se revela como o primeiro sinal de cura. Não há gritos, não há confrontos. Apenas a percepção de que continuar é se machucar, e partir é um ato de autocuidado.
Quando finalmente se encontra coragem para aceitar o que sempre foi evidente, a separação não é sobre raiva, mas clareza. Aquele que sempre foi o suporte percebe que também precisa de chão. E ao retirar a base que sustentava o outro, não destrói nada; ao contrário, devolve o peso que nunca foi seu. Há uma tranquilidade em reconhecer os limites, uma paz que vem do simples ato de parar de insistir.
Fechar a porta não é vingança, é a maneira mais silenciosa de dizer que já se deu o suficiente. E é nesse silêncio que, pela primeira vez, começa o verdadeiro recomeço. É o momento em que a ausência deixa de ser uma perda e se transforma em espaço. Onde a insistência antes existente dá lugar à liberdade. O amor que carregou demais finalmente percebe que não precisa provar seu valor permanecendo. Às vezes, a forma mais profunda de amor é, na verdade, deixar ir, não por indiferença, mas por respeito à própria integridade.
04 novembro 2025
Sobre desequilíbrio e fechamentos silenciosos
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