O começo de alguns relacionamentos é muitas vezes cercado por um discurso sobre crescimento pessoal que já se tornou um clichê. Fala-se de fases de amadurecimento, sobre a busca do amor próprio, do desejo de ser uma pessoa melhor antes de se entregar de novo. À primeira vista, parece um gesto honesto e de autoconhecimento, mas muitas vezes essa narrativa funciona como um escudo emocional. É uma forma sutil de manter distância, enquanto a aparência de envolvimento permanece. A promessa de mudança acaba servindo para justificar o afastamento e adiar a entrega, transformando o autoconhecimento em uma estratégia inconsciente de evitar a vulnerabilidade. No início, tudo parece verdadeiro. A conexão é forte, as palavras são escolhidas com cuidado, existem gestos de envolvimento e promessas para o futuro. Mas essa fase inicial é mais sustentada pela idealização do que pela real disposição de continuar. Quando o vínculo começa a se tornar concreto, o medo aparece, e a mágica se transforma em recuo.
A pessoa que antes estava aberta agora se esconde atrás de justificativas sutis. Fala sobre a necessidade de um tempo, sobre o medo de machucar o outro ou sobre a importância de ir devagar. Esses argumentos parecem racionais, mas na verdade revelam uma tentativa inconsciente de manter o controle. Dizer que está se reestruturando não é sempre uma mentira, mas muitas vezes é só um adiamento. É uma maneira de continuar presente na aparência, enquanto corpo e emoção já se afastam. A prova disso ser parcialmente verdade é que evitativos continuam a buscar por dopamina nesse período através de flertes e relações casuais.
Quem tem medo do envolvimento aprende a mostrar interesse sem se comprometer. Aprende a dizer o que o outro gostaria de ouvir, a criar a imagem da pessoa ideal enquanto mantém o coração fechado. E ao conseguir cria barreiras e exigências absurdas ou subjetivas que o outro não pode cumprir. Isso não é manipulação, mas sim defesa. Por trás dessa confusão emocional existe um medo antigo que é o de ser visto por inteiro e ser rejeitado por isso. Entender essa dinâmica não significa justificar, mas perceber que o afastamento nem sempre vem da falta de sentimento. Muitas vezes, ele surge da dificuldade de lidar com o que o afeto traz à tona. A ferida não está na ausência de amor, mas sim no pânico instintivo de encarar o que o sentimento é capaz de revelar.
27 outubro 2025
Sobre o disfarce da autossabotagem emocional
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