Quando alguém de padrão evitativo encerra uma relação alegando precisar de tempo e espaço para se curar, a justificativa soa racional e até nobre. Fala-se em autoconhecimento, em reconstrução pessoal, em necessidade de solidão para evoluir. No entanto, o que ocorre na maioria das vezes não é trabalho interno, mas fuga. A distância que se cria não serve para elaborar emoções, e sim para silenciá-las. O afastamento se torna um mecanismo de autodefesa, não um gesto de maturidade.
O evitativo se retira quando o vínculo desperta um medo antigo, o de perder a individualidade dentro da relação, o de ser engolido pela presença emocional do outro, o de reviver o abandono e a rejeição que moldaram sua infância. Esses medos não são conscientes, mas determinam o comportamento. O que se apresenta como serenidade é, na verdade, um processo de desativação emocional. Os sentimentos são enterrados, congelados, removidos do campo da consciência. É assim que o evitativo acredita manter-se seguro, afastando o que o faz sentir. Essa estratégia nasce de uma aprendizagem precoce. Quando a expressão emocional foi recebida com indiferença ou punição, o afeto passou a ser associado à dor. O resultado é uma forma de sobrevivência afetiva: não sentir para não perder. Dentro dessa lógica, qualquer proximidade se transforma em ameaça, e o contato com as próprias emoções equivale a um risco. Por isso, quando a relação desperta algo real, o impulso é recuar. Não por falta de interesse, mas por incapacidade de lidar com o desconforto que a intimidade provoca.
Durante o afastamento, o evitativo raramente reflete. O vazio é preenchido com distrações, rotinas exaustivas, novas relações ou qualquer fonte de estímulo que impeça o contato com a vulnerabilidade. O que parece tempo para si é, na prática, um movimento de negação. O silêncio serve para anestesiar, não para compreender. Enquanto acredita estar se protegendo, a pessoa perpetua o mesmo padrão que a distancia dos vínculos que poderiam transformá-la. Evitar é uma forma de autocontrole construída sobre a dor. Quem a pratica não foge apenas do outro, mas da própria emoção que ameaça emergir. Por isso, o afastamento não cura, apenas adia o confronto com o que um dia precisará ser sentido para, enfim, ser entendido.
10 outubro 2025
Sobre a fuga disfarçada de autocuidado
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